Nova Lei altera método de correção monetária sobre depósitos judiciais, causando dúvidas e insegurança jurídica aos contribuintes.

Nova Lei altera método de correção monetária sobre depósitos judiciais, causando dúvidas e insegurança jurídica aos contribuintes.

Durante uma discussão judicial contra a União Federal, em uma demanda tributária, por exemplo, existem basicamente três formas de se obter a suspensão da exigibilidade do crédito tributário: (a) mediante concessão de medida liminar pelo Juízo; (b) mediante depósito judicial do montante integral; e (c) mediante pagamento para posterior pedido de restituição – esta última, na verdade, extingue o crédito tributário, pelo pagamento, daí porque também não mais exigível.

O depósito judicial sempre foi classificado como o caminho do meio, a opção mais segura e conservadora, porque não faz acumular eventual passivo, mas também é rápido o reembolso, em caso de vitória do contribuinte.

A rigor, em todas estas modalidades, a correção monetária dos valores objeto da lide sofreriam rigorosamente o mesmo tratamento: ao final, o vencedor ‘receberia de volta’ o valor suspenso, depositado ou pago/restituído,  devidamente corrigido, pelo mesmo índice de correção monetária. Um tratamento igualitário entre as partes.

Entretanto, a ânsia arrecadatória do fisco culminou em mais uma inovação jurídica, desta vez sobre a correção monetária de depósitos judiciais havidos em processos nos quais a União Federal seja parte.

Antes, o contribuinte que efetuava depósitos judiciais no curso de uma demanda contra a União Federal, veria os recursos depositados devidamente corrigidos pela SELIC, mesmo índice aplicado pela própria União Federal, nas cobranças praticadas em face dos contribuintes.

Agora, na vigência da novel Lei 14.973/2024, no momento do levantamento de depósitos judiciais pelo contribuinte, o art. 37, inciso II dispõe estes valores serão “acrescidos de correção monetária por índice oficial que reflita a inflação”. Atualmente, o Poder Judiciário tem adotado o IPCA como índice oficial.

Ocorre que esta alteração legislativa causa indignação e insegurança jurídica aos jurisdicionados.

Primeiro, porque a Lei não indica expressamente qual seria o índice a ser utilizado na correção monetária, deixando tal opção a cargo do Judiciário, ou eventualmente do próprio Executivo.

Segundo, porque dá tratamento anti-isonômico (não igualitário) entre a União Federal e o contribuinte, pois as cobranças realizadas pelo fisco continuarão a ser remuneradas pela SELIC, ao passo que os reembolsos de depósitos judiciais passariam a ser remunerados apenas pelo IPCA (uma diferença de aprox.. 6% ao ano, considerando apenas os patamares atuais.

Mas não é só isso.

Já havia uma incongruência de tratamentos operada pelo próprio Poder Judiciário, no que diz respeito à tributação destas correções monetárias. Enquanto o STF sacramentou, através do TEMA 962 de Repercussão Geral, que “É inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário.”, o mesmo STF relegou para o STJ a respeito dos depósitos judiciais, tendo este Tribunal entendido que “Os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais possuem natureza remuneratória e não escapam à tributação pelo IRPJ e pela CSLL. (TEMA 504 de Recursos Repetitivos).”

Embora a nova legislação preveja tão somente correção monetária, afastando a SELIC que tinha caráter híbrido (correção + juros), não se descarta a possibilidade do fisco tentar cobrar IRPJ e CSLL mesmo neste novo modelo.

Portanto e em suma, se o contribuinte efetua o pagamento do tributo, submetendo-se ao solve et repete, e depois obtém o direito à restituição do tributo pago indevidamente, a um só tempo ele terá (a) direito de receber o valor devidamente corrigido pela SELIC do período; e (b) não precisará submeter os valores relativos à SELIC à tributação de IRPJ e CSLL.

Por outro lado, se o contribuinte opta por depositar em juízo o valor controvertido, discutindo desde logo a incidência tributária, e sagrando-se vencedor na contenda, este mesmo contribuinte (a) receberá seus valores apenas “acrescidos de correção monetária por índice oficial que reflita a inflação”; e (b) poderá ter que submeter os ganhos decorrentes à tributação de IRPJ e CSLL.

Diante desse cenário, ao avaliar a estratégia processual mais adequada para cada caso concreto, agora também é preciso levar em consideração estas novas questões, porque a depender da estratégia o incremento econômico do valor é considerável, sem prejuízo do questionamento da própria (in)constitucionalidade desta nova forma de correção monetária dos depósitos judiciais.

Texto de Douglas Heidrich – Advogado e Sócio RSH Advogados Associados